Judeus no mundo

IÊMEN


Os judeus do Iêmen são, por definição, pertencentes ao grupo étnico-cultural da sociedade israeli denominado Mizrahi. No entanto, os iemenitas adotaram um nome próprio, o que reflete sua história e identidade diferentes das dos judeus de outros países árabes – Teimanim.

 

Não se sabe com certeza como os judeus chegaram ao Iêmen. Suas tradições datam a existência da comunidade desde os tempos do Rei Salomão (por volta de 900 AEC).

 

Uma explicação é que Salomão teria enviado mercadores para buscar ouro e prata para decorar o Templo Sagrado.

 

Outra tradição diz que artesãos judeus chegaram ao Iêmen a pedidos da rainha de Sabá, que dominava partes da Etiópia, da Eritréia e do Iêmen.

 

Uma terceira lenda conta que quando Esdras conclamou os judeus a voltarem para Jerusalém, eles desobedeceram. Esdras teria, então, banido eles. A lenda conta que o profeta amaldiçoou-os a serem pobres (o Iêmen é um país muito pobre) e que por estas ações apressadas o escriba teria perdido o direito de ser enterrado em Israel. (Sua tumba é geralmente descrita como um local em Basra, no Iraque, antiga Babilônia, de onde viera). De acordo com a lenda, é dito (mas não pode ser verificado) que nenhum judeu iemenita põe o nome de Ezra em seu filho. No entanto, alguns sábios iemenitas em Israel hoje rejeitam enfaticamente esta estória como mito, senão como blasfêmia.

 

Uma quarta tradição conta que quando o profeta Jeremias anunciou a destruição do Primeiro Templo, em 629 AEC, 42 anos antes de o Templo ser destruído, um grupo de judeus ricos deixou Jerusalém, estabelecendo-se no Iêmen.

 

Uma quinta lenda fala que os teimanim são descendentes de judeus de uma brigada despachada antes da destruição do Segundo Templo pelo rei Herodes para ajudar as tropas romanas que lutavam na região.

 

Os historiadores, por sua vez, acreditam que os teimanim chegaram a este país através das ligações navais e comerciais estabelecidas pelo rei Salomão com os reinos da região.

 

No entanto, a única evidência factual da existência da comunidade judaica no Iêmen data do século III da Era Comum. Nesta época, era comum entre a dinastia no poder, os Hymiaritas, converter-se ao judaísmo, até que, por volta do ano 400, o rei Abu-Kariba Asad converteu-se ao judaísmo, chegando até a espalhar a fé judaica por seus domínios. Nesta situação confortável em que o judaísmo era a religião dominante, os judeus prosperaram e se multiplicaram. Chegaram a ser decisivos numa batalha contra o exército do reino de Axum, para a qual judeus de toda a Arábia foram convocados.

 

Em 525 EC, o reino cristão de Axum (parte do que hoje é a Etiópia e a Eritréia) conquistou a região do Iêmen, impondo seu domínio.

 

No século VII, com a expansão islâmica na península arábica e a unificação destes povos sobre a religião maometana, a situação judaica mudou. Passaram a ser regidos pelo estatuto da dhimmis, que os relegava a cidadãos de segunda classe, mas os protegia conquanto pagassem um imposto, pois eram um dos ‘povos do livro’. O contato dos judeus com outras comunidades durante esse período foi pequeno e os teimanim começaram a absorver característica da cultura árabe.

 

Parece que a situação do povo judeu não era a melhor. Tinham tido sucesso no campo profissional, mas houve perseguições e abandono da fé. Quando o sultão curdo Saladino assumiu o poder, no fim do século XII, houve uma revolta de extremistas xiitas contra ele e, ao mesmo tempo, a população judaica do Iêmen foi perseguida e houve tentativas de conversão forçada. Além disso, um judeu convertido ao Islã passou a pregar contra os judeus e um falso messias apareceu. A moral do povo judeu estava acabada. Vendo isso, um estudioso iemenita escreveu a Maimônides pedindo ajuda. Rambam respondeu com a Iggeret Teiman (Epístola ao Iêmen).

 

A carta conseguiu fazer efeito e os judeus se mantiveram firmes em sua religião. Ela explicava o ódio e a perseguição aos judeus, falava dos 13 princípios de fé, dos atributos de D’us, da vinda do Messias e dos judeus como Povo Escolhido. Depois Maimônides intercedeu junto a Saladino e as perseguições cessaram. Em gratidão, Maimônides passou a ser citado no Kaddish iemenita.

 

Entre os séculos XIII e XVI, o Iêmen foi conquistado pela tribo africana dos Rasulidas e em 1547 pelos turcos. Com o Iêmen integrado ao gigantesco Império Turco-Otomano, os teimanim puderam estabelecer contato com os cabalistas de Tzfat e com outras comunidades judaicas.

 

Quando os Zaydis (um grupo islâmico xiita) conquistaram o Iêmen, em 1630, novamente houve uma piora. 49 anos depois eles foram todos expulsos para a região de Mawza, na costa do Mar Vermelho, onde muitos morreram de doenças e fome. Mais ou menos um ano depois, eles foram trazidos de volta para o centro do Iêmen, pois eram necessários para a economia, já que eram muitos dos artesãos e manufatureiros. Quando voltaram, encontraram suas casas e artigos religiosos destruídos, foram forçados a morar em bairros fora das cidades e impedidos de construir casas maiores que as dos muçulmanos ao redor.

 

No fim do século XVIII, foi criada uma lei que forçava o estado a tomar para si e educar de maneira islâmica qualquer órfão menor de idade que estivesse na classe dhimmis, como os judeus e os cristãos. Eles foram proibidos de andar de camelo e cavalo, tendo que andar de burro e mula, obrigados a andarem descalços no bairro muçulmano e proibidos de se defenderem caso atacados com pedras ou punhos por jovens muçulmanos.

 

No entanto, assim como na Europa, os judeus acharam seu nicho no mercado. Tornaram-se mestres em áreas que os muçulmanos não favoreciam, como carpintaria, sapataria, argila, alfaiataria, conserto de armas e ferramentas, como ferreiros, mercadores de café e joalheiros. No início do século XIX havia em torno de 30.000 judeus no país.

 

Em 1872, os turcos retomaram o controle, as condições melhoraram e restabeleceu-se o contato com outras comunidades. Dez anos depois, começou a emigração para a Palestina. Eles foram proibidos de emigrar no ano seguinte, mas continuaram mesmo assim. Eram números pequenos, mas com alguns picos, especialmente quando se deu a Declaração de Independência de Israel. Por volta de 1950, a maioria dos teimanim já se encontrava em Israel.

 

Este contato com as outras comunidades gerou uma divisão interna entre a comunidade iemenita. Uma parte da comunidade, o movimento Dor Daim, queria que o judaísmo retornasse à forma de maimônides, do Iêmen de antes de 1600, antes da assimilação da literatura cabalista, como o Zohar, que eles consideravam crenças alienígenas e irracionais. A oposição os Iqshim, não queria deixar de praticar a kabbalah. A divisão evolui para 3 grupos que diferem basicamente no nível de aceitação da kabbalah, um tenta utilizar ao máximo os ensinamentos do Ari (Isaac Luria), um rejeita o Zohar e o outro se equilibra num meio termo.

 

Os teimanim se sentavam no chão em suas sinagogas e sua dicção, entonação, melodia e sotaque em hebraico são consideradas por Stanley Mann, escritor que mora em Israel e escreveu sobre os judeus do Iêmen, a mais correta, muito superior à ashkenazi e à sefaradi.

 

Em comunidades grandes, as crianças judias estudavam desde os três anos de idade.

 

No ano da criação de Israel, 1948, havia 55.000 judeus no Iêmen e mais 8.000 em Áden, uma colônia inglesa dentro do país.

 

Um ano antes, quando a partilha da Palestina foi aprovada, muçulmanos revoltados e a polícia se juntaram e realizaram um pogrom em Áden que deixou 82 judeus mortos e destruiu centenas de casas e lojas. A comunidade ficou economicamente paralisada. No início de 1948, a falsa acusação de assassinato ritual de duas garotas fez com que a comunidade fosse saqueada.

 

A situação perigosa da comunidade judaica no país levou Israel a agir diretamente, lançando a Operação Tapete Mágico. Israel decidiu resgatar de avião os judeus do Iêmen e trazê-los para seu território. 28 pilotos realizaram 380 vôos perigosos, inclusive sobre território inimigo, como o do Egito, para trazer os teimanim para Eretz Israel. Os aviões decolavam da base em Asmara na Eritréia, iam até Áden, levavam os judeus até Israel e depois passavam a noite no Chipre. Um dos maiores problemas era a falta de combustível. No entanto, não houve nenhuma perda de vidas.

 

A operação foi realizada em segredo e contava com a autorização do novo líder religioso do Iêmen, Ahmad bin Yahya. Desta maneira, 47 mil iemenitas, 1500 judeus de Áden e 500 do Djibouti e da Eritréia fizeram aliá. Como eles eram muito pobres e a maioria nunca tinha visto ou sabia o que era um avião, eles tinham muito medo de entrar nele. Então o rabino citou o seguinte verso do Tanach que profetizava o salvamento dos filhos de Israel para convencê-los a entrar no avião:

 

    Isaías 40:31 - "Mas aqueles que têm esperança no SENHOR terão renovada sua força. Eles voarão em asas, como águias; eles correrão e não se cansarão, eles caminharão e não se fatigarão."

 

O nome oficial da operação era ‘Operação nas Asas de Águias’. O nome foi retirado do versículo acima e também do seguinte:

 

    Exôdus 19:1 - "Vocês mesmos viram o que eu fiz no Egito, e como eu os carreguei em asas de águias e os trouxe até mim."

 

Uma migração menor, mas contínua, teve permissão para continuar até que uma guerra civil no país, em 1962, acabou com a emigração judaica. Até 1976, quando um diplomata americano encontrou uma pequena comunidade judaica no norte do Iêmen, pensava-se que os judeus no Iêmen não existiam mais. Na verdade, algumas pessoas não quiseram abandonar seus parentes velhos e doentes e permaneceram no Iêmen. Estas pessoas eram proibidas de emigrar e estavam isoladas, dispersas nas regiões montanhosas do norte do Iêmen e necessitando de roupas, comida, tratamento médico e artigos religiosos. Devido a estas condições difíceis, alguns teimanim abandonaram o judaísmo e se converteram ao islã.

 

A pequena comunidade que permanece no Iêmen até hoje é tolerada e pode praticar sua religião, mas não podem servir no exército e serem eleitos para cargos políticos, além de serem tratados como cidadãos de segunda classe. São confinados a uma parte da cidade e há um número limitado de profissões que podem ocupar, geralmente trabalhando como fazendeiros e artesãos. Eles podem ter terras e exercem esse direito.

 

Os judeus estão dispersos e não existe uma estrutura comunitária. O contato com os vizinhos muçulmanos é muito restrito e eles são impedidos de se comunicar com o judaísmo mundial. Acredita-se que existam duas sinagogas funcionando em Saiqaya e Amlah. Os judeus também não se casam fora da religião.

 

Em 2001, um judeu foi listado como candidato a uma cadeira no parlamento pelo partido dominante. Isto foi visto como um gesto de boa-vontade com o governo de Bush, para convencê-lo a dar ajuda econômica ao Iêmen. No entanto, o comitê geral eleitoral invalidou a candidatura de Ibrahim Ezer, argumentando que os candidatos devem ser filhos de ambos pais muçulmanos.

 

Nos últimos anos, apesar da proibição do governo iemenita, cerca de 400 judeus fizeram aliá. Um fato interessante é que é proibido entrar no Iêmen (assim como na maioria dos países árabes) com um passaporte que contenha um visto israelense, mesmo se o turista não é de cidadania israelense, basta ter estado em Israel para ter sua entrada negada.